Como superar o sofrimento: parte 3 (4.12-19)
Mediante sobriedade
“Porque chegou o tempo de começar o juízo pela casa de Deus; e, se começa por nós, qual será o fim daqueles que não obedecem ao evangelho de Deus? E, ‘se é com dificuldade que o justo é salvo, que será do ímpio e do pecador?’” (versículos 17-18).
No versículo 18, Pedro cita Provérbios 11.31: “Se o justo é punido na terra, quanto mais o ímpio e o pecador!”. A Septuaginta (tradução grega do AT) diz: “Se o justo é salvo arduamente, onde se apresentará o ímpio e pecador?”. Os judeus deduziam deste versículo que os justos sofrem nesta vida, mas os ímpios e pecadores no mundo futuro.
Em primeiro lugar, é preciso novamente olhar o contexto histórico; há aqui uma espécie de jogo de palavras. Se, como casa espiritual, os cristãos já precisavam passar pelo julgamento que lhes sobreveio por meio dos romanos, como será o fim da casa em Jerusalém? Eram justamente os líderes religiosos em torno da casa em Jerusalém, do templo, que rejeitavam rigorosamente a mensagem do evangelho. Rebelavam-se contra os apóstolos e recusavam-se a crer no evangelho de Deus. Levaria só mais alguns poucos anos até a destruição de Jerusalém e do templo (em 70 d.C. pelos mesmos romanos). Esse seria o destino dos judeus que rejeitaram o evangelho. Se os crentes já não foram poupados, quanto menos os descrentes?
Do ponto de vista profético, essa declaração também adquire significado para a futura grande tribulação. Quando pessoas (judeus) convertidas lerem tal frase – “chegou o tempo de começar o juízo pela casa de Deus; e, se começa por nós...” –, poderão aplicá-la ao tempo delas, uma vez que aquele já será literalmente um tempo de juízo. Embora sejam salvas, muitas terminarão como mártires, enquanto outras, aquelas que seguirem o sistema anticristão, se perderão.
O crente só é salvo graças à obra de Jesus, pela graça, e não em função de obras próprias.
Aplicado a nós, isso significa que, se o cristão já precisa sofrer e ser disciplinado, quanto mais sofrerão e serão punidos aqueles que não crerem no evangelho? O sofrimento dos cristãos se dá por amor a Jesus, o sofrimento dos desobedientes se deve ao pecado. O sofrimento dos cristãos é limitado ao tempo presente; o dos descrentes, à eternidade.
Essa declaração também destaca a grandeza da salvação porque, se o crente só é salvo graças à obra de Jesus e por isso “com dificuldade”, ou seja, pela graça e não em função de obras próprias, então aqueles que não lançaram mão da justificação em Jesus não terão a menor chance.
Com confiança
“Por isso, também os que sofrem segundo a vontade de Deus entreguem a sua alma ao fiel Criador, na prática do bem” (versículo 19).
O pior que pode acontecer em meio ao sofrimento é abandonarmos a confiança. Certa vez, li o testemunho de como uma pessoa que havia estudado teologia começou aos poucos a duvidar de Deus e da sua atuação. Simplesmente havia muita coisa que não entendia; por que Deus permitia tudo aquilo etc. Diante disso, essa pessoa interrompeu seus estudos e aprendeu uma outra profissão. Anos depois, percebeu que a falta da proximidade de Deus é muito mais trágica que as perguntas que nem sempre são respondidas. Não conseguindo mais suportar a vida sem Deus, encontrou o caminho de volta e retomou o estudo de teologia.
Pedro explicou nos versículos precedentes que não há motivo para desistir. O sofrimento não é sinal da ausência de Deus, mas justamente um sinal da sua presença: tudo ocorre com sua permissão, e em meio a isso ele nos vigia amorosamente.
O pior que pode acontecer em meio ao sofrimento é abandonarmos a confiança.
Para enfatizar, Pedro aponta “ao fiel Criador”. Deus criou e organizou o mundo, tendo-o preservado e guardado até hoje através de todas as tormentas. Com isso Deus prova sua fidelidade; se ele domina os poderes da natureza, ele também haverá de nos guardar em nossas dificuldades e aflições.
Todo aquele que sofre pode se entregar confiantemente ao Senhor e com isso praticar o bem “para que a fé e a esperança de vocês estejam em Deus” (1Pedro 1.21).
Podemos imaginar os efeitos de não duvidarmos de Deus no sofrimento, mas de confiarmos nele, continuando a praticar o bem. Por exemplo, um cônjuge sofrendo por causa do outro, um estudante sendo maltratado pelos colegas, um empregado desprezado e evitado no local de trabalho, uma criança xingada por seus pais, cristãos perseguidos em suas comunidades... Pedro insiste em apelar à prática do bem porque este é o meio de conquistar ainda outros para Jesus e de ser um testemunho a favor de Deus.
Boas obras em nome de Jesus são a proclamação mais clara: “Tendo conduta exemplar no meio dos gentios, para que, quando eles os acusarem de malfeitores, observando as boas obras que vocês praticam, glorifiquem a Deus no dia da visitação” (1Pedro 2.12).