O Perigo de se Criar Deus à nossa Imagem e Semelhança

Daniel Lima

Compartilhe:  Compartilhar no WhatsApp Compartilhar no Facebook

Sentamo-nos para mais uma conversa. Já havíamos esgotado os argumentos sobre o assunto de divórcio e recasamento. Eu havia explicado cuidadosamente por que entendia que sua decisão de se divorciar de sua esposa de mais de 30 anos e casar-se com outra mulher não era da vontade de Deus. Após mais algumas considerações, eu virei minha Bíblia para ele e pedi que ele me explicasse como entendia 1Coríntios 7.10-11:

“Aos casados, dou este mandamento, não eu, mas o Senhor: que a esposa não se separe do marido. No entanto, se ela o fizer, que permaneça sem se casar ou, então, que se reconcilie com o marido. Quanto ao marido, não se divorcie da sua mulher”.

Após ler silenciosamente esses versículos, sobre os quais já havíamos conversado, ele empurrou a Bíblia de volta para mim e disse: “O meu Jesus, com quem tenho vivido todos esses anos, a quem tenho orado e adorado, não diria isso!”.

Essa cena real foi um choque para mim. Ele havia crescido na igreja, conhecia a Bíblia, havia sido exposto a excelente ensino cristão e tinha vivido cercado de cristãos. Aqui estava um homem inteligente que estava tomando uma decisão que desagradava ao Senhor. Quando confrontado com a Palavra ele simplesmente diz que “seu jesus” não diria isso.

Eu gostaria que esse fosse um caso isolado, mas percebo que é cada vez mais comum. Com o avanço do pensamento pós-moderno e com a crescente relativização da verdade, tenho visto mais e mais cristãos desenvolvendo um conceito pessoal de “jesus” que não é o Jesus da Bíblia. Não surpreendentemente, esse “jesus pessoal” está de acordo com os planos do indivíduo que o “criou”, assim, o homem cria um jesus à sua imagem e semelhança.

Com o avanço do pensamento pós-moderno e com a crescente relativização da verdade, tenho visto mais e mais cristãos desenvolvendo um conceito pessoal de “jesus” que não é o Jesus da Bíblia.

Para qualquer indivíduo honesto, essa linha de raciocínio não faz sentido e é só uma desculpa para desobedecer a Deus. Recentemente, no entanto, tenho lido e ouvido um embasamento teológico para essa distorção do ensino bíblico. O argumento começa com uma verdade (toda boa mentira começa com uma verdade inegável). O começo é que Jesus é a chave hermenêutica ou de interpretação da Bíblia.

Jesus é descrito como a Palavra de Deus (João 1.1-3) e como a “expressão exata” de Deus (Hebreus 1.3). Sendo assim, é verdade que Jesus é a chave que explica toda a Bíblia. Todo o desenvolvimento do Antigo Testamento, as ações de Deus, a lei mosaica e as alianças apontam para Jesus.

Esses pensadores afirmam ainda que Jesus não veio para julgar, mas para salvar (João 12.47). Jesus acolhe a todos (Mateus 11.28). A partir daí é que começa a distorção. Assim, toda vez que o Antigo Testamento, ou mesmo Paulo, fala sobre condenação ou julgamento, eu posso discordar deles, pois eles não representam Jesus, que é a chave de interpretação.

Percebam que a distorção ocorre não ao afirmar que Jesus é a chave de interpretação, mas ao construir uma imagem de Jesus que não se apoia na Bíblia. Por exemplo, em João 12.48, logo após afirmar que não veio para julgar, Jesus acrescenta: “Há um juiz para quem me rejeita e não aceita as minhas palavras; a própria palavra que proferi o condenará no último dia”. Logo, Jesus indica que Deus julgará quem não aceita suas palavras. E o mesmo Jesus que chama todos a experimentar seu alívio e consolo em Mateus 11.28 afirma um pouco antes, em Mateus 11.20-24, maldições contra três cidades que não creram. Jesus, que é a chave de interpretação da Bíblia, afirma que haverá julgamento, haverá condenação.

A verdade em si não tem de ser conveniente ou agradável, ou mesmo popular. A verdade existe independente de nossas preferências e escolhas.

É impossível separar na Bíblia a justiça e a santidade de Jesus de seu amor e de seu sacrifício. Qualquer tentativa assim vai necessariamente descaracterizar Jesus e criar um “jesus” que não é real, mas um conveniente fruto de preferências e conveniências humanas. O Jesus de verdade afirma em João 8.32 que, por meio dele, conheceremos a verdade e a verdade nos libertará.

A verdade não muda de acordo com minhas preferências ou interpretações. O que pode mudar é meu entendimento da verdade. A verdade em si não tem de ser conveniente ou agradável, ou mesmo popular. A verdade existe independente de nossas preferências e escolhas. Minha oração é que eu e você, querido leitor, possamos crescer em conhecer o Jesus bíblico, histórico. Criar um Jesus segundo minha imagem e semelhança é correr trás do vento.
 

Compartilhe:   Compartilhar no WhatsApp Compartilhar no Facebook

Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por cinco anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem quatro filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 25º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.

Veja artigos do autor

Itens relacionados na livraria

Leia também

Como abandonar sua fé
Como abandonar sua fé
Daniel Lima
Cuidado com o que você deseja
Cuidado com o que você deseja
Daniel Lima
Integridade e Fidelidade
Integridade e Fidelidade
Daniel Lima
Interação e Fidelidade
Interação e Fidelidade
Daniel Lima
Arrependimento que liberta
Arrependimento que liberta
Daniel Lima
A Corrente da Insensatez – Nadando Contra a Corrente
A Corrente da Insensatez – Nadando Contra a Corrente
Daniel Lima
Compartilhe:   Compartilhar no WhatsApp Compartilhar no Facebook

Destaques

A Cronologia do Fim dos Tempos

R$43,90

Manual de Escatologia Chamada

de R$79,90
por R$55,90

Atos

R$119,90

Liderando Mulheres em Conflito

R$39,90

Receba o informativo da Chamada

Artigos Recentes