Por que Deus não se revela de forma clara e inequívoca a todas as pessoas? Existiria alguma razão para que ele permanecesse, de certa forma, oculto ou escondido?
O próprio fato de que devemos discutir uma questão como essa trai um problema filosófico e teológico com o qual as pessoas lutam há centenas de anos: Deus não torna sua existência inegavelmente óbvia. Se o fizesse, este artigo não seria necessário; a existência de Deus seria uma conclusão clara. No entanto, isso está longe de ser o caso. Os ateus frequentemente afirmam que não há evidência relevante da existência de Deus e prontamente descartam tais discussões. Os cristãos e outros teístas acreditam que Deus se revelou suficientemente para crer, mas muitas vezes ainda desejam saber por que Deus não se revelou mais.
Portanto, antes de examinar as evidências e os argumentos da existência de Deus, é útil ter uma estrutura para considerar por que Deus estaria oculto o suficiente para justificar essas discussões em primeiro lugar. Começaremos considerando a questão mais básica de todas.
Existe alguma evidência da existência de Deus?
Quando minha filha era pequena, ela alegremente me informou um dia que estava escondendo um minúsculo carrinho de brinquedo em seu quarto que havia encontrado no parque. Ela estava extraordinariamente orgulhosa de si mesma quando veio a mim e disse: “Está lá há dias, e você nem imaginou onde estava!”. Sua óbvia falha lógica foi que eu não sabia que deveria procurar um carro de brinquedo no quarto dela. Ela pensou que estava escondido; eu não tinha motivos para pensar que isso sequer existia.
Muitos ateus se sentem assim em relação a Deus. Eles dizem que não há evidências de sua existência e nenhuma razão válida para buscá-lo; aqueles que “encontram” Deus estão apenas promovendo o autoengano. Em outras palavras, Deus não está oculto – ele simplesmente não existe. Por exemplo, o autor ateu Dan Barker diz: “Sou ateu porque não há evidências da existência de Deus. Isso deveria ser tudo o que precisa ser dito sobre isso: nenhuma evidência, nenhuma crença”.[1] O autor ateu best-seller Richard Dawkins diz: “A fé é o grande segredo, a grande desculpa para fugir da necessidade de pensar e avaliar evidências. Fé é crença apesar, ou talvez por causa, da falta de evidências”.[2] Barker e Dawkins, como muitos ateus, afirmam essa suposta falta de evidência como um fato universalmente reconhecido e continuam alegando que os teístas não são razoáveis por acreditarem em Deus de qualquer maneira. É essencial entender, no entanto, que esse não é um fato universalmente reconhecido. Nem teístas, nem ateus estão dispostos a acreditar em algo sem evidência. Os teístas acreditam que há evidências da existência de Deus (mesmo que ele esteja um tanto oculto) e acreditam por causa disso, não apesar de não terem isso.
Como as pessoas podem tirar conclusões tão diferentes? Essa é apenas a natureza de qualquer tipo de evidência. A própria evidência não diz nada – toda evidência requer interpretação humana. E, como as evidências exigem interpretação humana, sempre haverá conclusões diferentes, dependendo das informações disponíveis, experiências de vida e motivações de uma pessoa. Só porque Deus não tornou sua existência inegavelmente óbvia, não é necessária a conclusão ateísta comum de que ele não nos deu nenhuma evidência. Teístas e ateus simplesmente discordam da interpretação das evidências.

Existe evidência suficiente da existência de Deus?
Em vez de dizer que não há evidência para Deus, muitas pessoas dizem que a evidência não é forte o suficiente. Suficiente, no entanto, é uma quantidade altamente subjetiva. O que pode ser suficiente para uma pessoa crer em Deus pode não parecer suficiente para outra pessoa. Por exemplo, considere esta lista de desejos de um blogueiro ateu:
Se eu visse uma mensagem inequívoca de Deus, seria persuadido de sua existência. Se eu visse uma escrita aparecer subitamente no céu, em letras a trinta metros de altura, dizendo “Eu sou Deus, eu existo, eis o que eu quero que você faça” – e se essa escrita fosse vista por todo ser humano, grafada em qualquer linguagem que eles entendessem, compreendida da mesma maneira por todos que a viram –, eu ficaria convencido de que Deus existe.[3]
Embora eu pessoalmente não precise que Deus escreva no céu para me convencer de sua existência, certamente posso me identificar com o desejo por esse tipo de revelação. Se fôssemos honestos, muitos de nós amaríamos encontrar Deus de maneira tão direta. Mas, quando Deus não se revela como pessoalmente gostaríamos, não se segue logicamente que não haja evidência suficiente para concluir que ele existe. Pelo contrário, há duas perguntas que devemos fazer a nós mesmos.
Primeira, nossos critérios são razoáveis? O blogueiro que acabei de citar está procurando por certeza absoluta. No entanto, se aplicássemos um critério semelhante a qualquer outra coisa na vida, haveria pouco que poderíamos afirmar que sabemos. Não temos esse tipo de evidência inegável para muitas coisas. Temos evidências inegáveis, por exemplo, de que Abraham Lincoln existiu? Não, mas todos concluímos que ele existiu com base na preponderância de evidências. Não devemos necessariamente esperar que a evidência da existência de Deus seja diferente (mais sobre isso em breve).
Quando Deus não se revela como pessoalmente gostaríamos, não se segue logicamente que não haja evidência suficiente para concluir que ele existe.
Segunda, qual é a melhor explicação para as evidências que temos – coisas como a origem do universo, a complexidade da vida e nosso conhecimento moral inato? A importância desta questão não pode ser exagerada. Para entender por que, considere por um momento como você reagiria se descobrisse uma noite que alguém invadiu sua casa e roubou tudo. Você não tem ideia de quem teria feito isso – não há suspeitos óbvios. A polícia chega e, depois de descobrir que não há evidências claras de quem cometeu o crime, eles desejam boa sorte e vão embora. É isso que você espera que eles façam?
Guia Geral da Apologética Cristã
Este guia aborda tópicos acerca da evidência da confiabilidade da Bíblia, do relacionamento entre ciência e fé, das comparações entre o cristianismo e outras cosmovisões, e muito mais.
Claro que não! Talvez ninguém tenha deixado uma nota clara confessando o crime, mas você ainda esperaria que a polícia olhasse para as evidências que de fato existem e criasse um perfil do suspeito. A questão não seria que tipo de evidência a polícia gostaria de ter, mas qual é a melhor explicação para a evidência que eles têm. Da mesma forma, podemos elaborar nossa própria lista de evidências que desejamos que Deus nos desse, mas isso é irrelevante. Não estamos absolvidos da necessidade de tirar conclusões sobre as evidências que temos apenas porque desejamos que as evidências fossem diferentes. Nossos padrões subjetivos podem ser um péssimo guia para determinar o que é verdade.
Mas por que Deus não se tornaria mais óbvio?
Embora não seja lógico concluir que Deus não existe simplesmente porque ele não se fez conhecido de acordo com os desejos subjetivos de cada pessoa, é razoável perguntar por que Deus não se revelaria de maneiras mais óbvias. Podemos não ter evidências claras de que Abraham Lincoln existia, mas a existência de Lincoln também não tem influência imediata em nossa vida. Se Deus é perfeitamente amoroso e bom, parece que ele tornaria sua existência tão óbvia que ninguém poderia negar – especialmente quando as pessoas desejam encontrá-lo mais diretamente.
Não estamos absolvidos da necessidade de tirar conclusões sobre as evidências que temos apenas porque desejamos que as evidências fossem diferentes.
A força desta pergunta é composta por duas verdades bíblicas: (1) Deus deseja que “todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade” (1Timóteo 2.4) e (2) Jesus é o único caminho para a salvação (João 14.6). Se nossa crença e confiança em Jesus têm consequências eternas, por que Deus permaneceria oculto – mesmo que um pouco? Essa tensão foi poderosamente afirmada pelo filósofo alemão ateu Friedrich Nietzsche (1844-1900):
Um deus onisciente e onipotente e que nem sequer garante que suas criaturas entendam sua intenção – poderia ser um deus de bondade? Quem permite que inúmeras dúvidas e dubiedades persistam, por milhares de anos, como se a salvação da humanidade não fosse afetada por eles, e que, por outro lado, mantém a perspectiva de consequências terríveis, se algum erro for cometido quanto à natureza da verdade?[4]
Embora possamos apenas ter um entendimento limitado do motivo por que Deus escolheu se revelar de certas maneiras, em certos momentos e em certas quantidades, os filósofos há muito identificaram pelo menos um possível motivo pelo qual Deus pode optar por permanecer tão oculto quanto o faz: preservar nosso livre-arbítrio.
De modo geral, o livre-arbítrio é a nossa capacidade de fazer escolhas sem coerção externa. Se Deus quisesse que o amássemos genuinamente, era necessário nos criar com algum grau de livre-arbítrio. Caso contrário, seríamos nada além de robôs, sem a capacidade de ter um relacionamento genuíno com nosso Criador. Esse fato está relacionado à questão da ocultação de Deus. Se Deus se revelasse de maneira inegável, estaria efetivamente tirando nossa liberdade de buscá-lo e amá-lo. Em vez de nos coagir a crer e confiar, ele nos dá espaço para persegui-lo ou evitá-lo genuinamente. O filósofo cristão Blaise Pascal (1623-1662) enuncia isso deste modo:
Disposto a aparecer abertamente àqueles que o buscam de todo o coração, e a se esconder daqueles que fogem dele de todo o coração, Deus regula tanto o conhecimento de si mesmo que deu indicações de si mesmo que são visíveis para aqueles que o buscam, mas não para aqueles que não o buscam. Há luz suficiente apenas para aqueles que desejam ver, e obscuridade suficiente para quem tem uma disposição contrária.[5]
Significativamente – especialmente no que se refere à preocupação de Nietzsche –, a Bíblia diz que, quando buscarmos Deus, o encontraremos (Deuteronômio 4.29). Embora Deus possa não se revelar da maneira inegável que muitos preferem, este versículo implica que Deus se revelou de maneiras suficientes para permitir que buscadores genuínos o encontrassem. De uma perspectiva cristã, isso inclui a revelação geral (conhecimento de Deus por meios naturais, como a observação da natureza, filosofia e raciocínio) e a revelação especial (conhecimento de Deus por meios sobrenaturais, como a Bíblia e a pessoa de Jesus Cristo).
E quanto àqueles que dizem que não conseguem encontrar Deus?
Mas e quanto àqueles que não encontram Deus, mesmo quando dizem que o procuram? Sua incredulidade parece contradizer Deuteronômio 4.29? A resposta está em Romanos 1.18-20 – todas as pessoas sabem que Deus existe, mas algumas suprimem a verdade:
Portanto, a ira de Deus é revelada dos céus contra toda impiedade e injustiça dos homens que suprimem a verdade pela injustiça, pois o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. Pois desde a criação do mundo os atributos invisíveis de Deus, seu eterno poder e sua natureza divina, têm sido vistos claramente, sendo compreendidos por meio das coisas criadas, de forma que tais homens são indesculpáveis.
Embora nunca possamos identificar por que determinada pessoa afirma não crer em Deus, sabemos pela Bíblia que algumas pessoas não depositam sua fé em Deus, não importa quanto ele se revele. Os israelitas, por exemplo, testemunharam os tipos de eventos sobrenaturais que muitos hoje desejariam experimentar, mas isso não resultou em sua crença e confiança inabaláveis em Deus (p. ex., veja todo o Antigo Testamento). No Novo Testamento, lemos como Jesus realizou sinais milagrosos, mas ainda havia pessoas que optaram por não acreditar (João 12.37). Se Deus escrevesse no céu hoje em dia, você poderia apostar que muitos ainda negariam a sua existência. Claramente, a fé em Deus é uma questão de coração e mente – independentemente de quão oculto ele possa parecer a qualquer momento.
Notas
- Dan Barker, Losing Faith in Faith (Madison, WI: Freedom from Religion Foundation, 1992), p. 87.
- Uma palestra de Richard Dawkins extraída de The Nullifidian (dez. 1994).
- Greta Christina, “6 Unlikely Developments That Could Convince This Atheist to Believe in God”, Alternet, 5 abr. 2015. Disponível em: https://www.alternet.org/2015/04/6-unlikely-developments-could-convince-atheist-believe-god/.
- Friedrich Nietzsche, Daybreak, trad. R. J. Hollingsdale (Cambridge, MA: Cambridge University Press, 1982), p. 89-90.
- Blaise Pascal, Pensées (Nova York: E. P. Dutton, 1958), p. 118.
Este artigo foi adaptado do livro Guia Geral da Apologética Cristã, editado por Joseph M. Holden.
Autor
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Natasha Crain (MBA, University of California; C.C.A., Biola University) é autora e palestrante. Sua paixão é ajudar os cristãos a refletir de forma clara e manter uma cosmovisão bíblica em uma cultura secular. Casada, tem três filhos.
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