Entre os diversos atributos de Deus, podemos encontrar a indignação ou a ira? E o que eles nos informam sobre o Deus da Bíblia?
Talvez não exista nada mais ofensivo publicamente do que falar de um Deus que se ira e, pior ainda, que condena. Recentemente, um influente pastor brasileiro falou: “Não creio em um Deus que é fogo consumidor, não creio em um Deus que condena e manda pessoas para o inferno eternamente”.
Este pastor, diga-se de passagem, totalmente alinhado com a ideologia humanista de esquerda, não está apenas apresentando uma interpretação heterodoxa de uma passagem bíblica, mas reconhece – na mesma mensagem – que a Bíblia faz essa afirmação (aliás, tanto no Antigo quanto no Novo Testamentos: Deuteronômio 4.24 e Hebreus 12.29). Ele está justamente deixando claro que não crê na Bíblia como revelação de Deus. Na verdade, ele se coloca como juiz de Deus.
Um pouco mais adiante em sua pregação, ele afirma que “Deus não está acima do certo e do errado”. É curioso como ele coloca algo, no caso algum padrão de certo e errado, acima do próprio Deus. Parece que, para esse pastor, Deus precisa se submeter a um padrão moral determinado pelo próprio pastor.
Qual é o critério?
É inegável que Deus não se contradiz. No entanto, o próprio Deus é o critério de certo e errado. Reparem que a oferta da serpente para Eva foi justamente esta: “Vocês, como Deus, serão conhecedores do bem e do mal” (Gênesis 3.5b).
A serpente, e o pastor mencionado, apresentam um conjunto de verdades morais (bem e mal) que existem fora do próprio Deus, que são absolutos universais acima de Deus. O problema é que não existe nada fora de Deus. Ele não só é o sustentador da vida, como também o padrão de toda verdade e bondade (veja, por exemplo, Salmos 100.5).
Negar a ira de Deus é muito popular hoje em dia, mesmo entre pessoas que se afirmam cristãs. Contudo, isso também significa negar a sua justiça, pois um Deus que não se indigna com o mal não é um Deus justo. Exatamente por ser o padrão do bem do mal, Deus expressa sua bondade e detesta o mal.
Deus e seus diversos atributos
Como, então, podemos entender um Deus irado sem negar ou diminuir seus demais atributos? Deixe-me alistar algumas considerações:
Primeiramente, a ira de Deus não é descontrole emocional – como muitas vezes vemos expresso entre nós, humanos. A ira humana é egoísta e perversa. O Novo Testamento usa duas palavras gregas: orge e thumos. Com frequência as palavras são usadas como sinônimos, embora a primeira (orge) tenha mais o sentido de indignação e a segunda (thumos) tenha mais o sentido de furor.

Indignação é definido como “sentimento de cólera ou de desprezo experimentado diante de indignidade, injustiça, afronta; repulsa, revolta”. Já furor é bastante distinto – “manifestação de ira extrema; ação violenta; cólera”.
Segundo, o próprio Deus afirma que dará tanto vida eterna aos que o buscam como ira e indignação contra os que são egoístas, rejeitam a verdade e seguem a injustiça. Em sua carta aos romanos, Paulo escreve:
“Ele dará vida eterna aos que, persistindo em fazer o bem, buscam glória, honra e imortalidade. Mas haverá ira e indignação para os que são egoístas, que rejeitam a verdade e seguem a injustiça.” (Romanos 2.7-8)
A verdade expressa aqui é que Deus resiste àqueles que se opõe a ele. Não se trata de um castigo caprichoso e sem razão. A afirmação não é a de que Deus decide punir inocentes. Até porque não existem inocentes (Romanos 3.10-12); em outros palavras, todos estamos condenados (Romanos 3.23) por nosso egoísmo, rejeição da verdade e aliança com a injustiça.
Um outro autor bíblico, conhecido como o apóstolo do amor, escreve tanto o texto conhecido de João 3.16 – “Porque Deus tanto amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” – quanto o versículo 36 do mesmo capítulo: “Quem crê no Filho tem a vida eterna; já quem rejeita o Filho não verá a vida, mas a ira de Deus permanece sobre ele”.
É evidente que não é possível ignorar a ira (ou indignação) de Deus sem igualmente rejeitar sua justiça, bem como desvalorizar o preço pago na cruz por nossos pecados. O que foi pago não foi meramente uma multa por um ato contra uma lista de ordenanças; o que se pagou foi a nossa rebeldia e rejeição contra o próprio Deus!
Fomos alertados que “nos últimos dias sobrevirão tempos terríveis” (2Timóteo 3.1). Logo em seguida, o texto nos alerta para uma série de atos de rebeldia contra Deus, e no versículo 5 há uma descrição de quem serão estes desobedientes: “Tendo aparência de piedade, mas negando o seu poder”.Minha oração, por você e por mim, e até mesmo pelo pastor citado acima, é que tomemos muito cuidado ao tentar adaptar a mensagem do evangelho para agradar os paladares modernos.
Autor
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Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por cinco anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem quatro filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 27º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.
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