Qual o tema central das parábolas de Lucas 15? Que papel o arrependimento desempenha nessas histórias?
Você já foi assistir um filme pensando que tratava de um tema e descobriu que era sobre outra coisa completamente diferente? Já passei por essa experiência e, lamentavelmente, não consegui nem aproveitar o filme, pois esperava algo diferente. O mesmo ocorre quando vamos estudar uma passagem bíblica. Além de observar o contexto, uma das primeiras coisas que precisamos fazer é compreender o tema central, o propósito da passagem. Por que esta passagem está aqui? Qual sua mensagem central? É uma história? É uma profecia? É uma poesia, é uma exortação? Diferentes textos têm temas ou propósitos diferentes.
Além de observar o contexto, uma das primeiras coisas que precisamos fazer é compreender o tema central, o propósito da passagem.
Li certa vez que alguém afirmou que o propósito do capítulo 15 é falar sobre a necessidade de arrependimento. Não posso concordar. Apesar de mencionar arrependimento várias vezes, o propósito do texto é outro. Eu convido você a examinar comigo, para que possamos aprender com Jesus nessa passagem.
Lucas 15 relata três parábolas que Jesus conta a fariseus e mestres da Lei, assim como a publicanos e pecadores, em resposta às críticas dos primeiros diante do envolvimento de Jesus com pecadores. Nas três parábolas algo é perdido e depois encontrado. As três histórias seguem a mesma sequência – algo é perdido, o proprietário busca até encontrar e depois festeja a recuperação do que havia sido perdido. No entanto, há diferenças profundas e a terceira história é a mais elaborada e rica em detalhes e ensinos.
Repare como a ênfase do ensino é sempre o reencontro do que foi perdido:
“Eu lhes digo que, da mesma forma, haverá mais alegria no céu por um pecador que se arrepende do que por noventa e nove justos que não precisam se arrepender. Eu digo que, da mesma forma, há alegria na presença dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende. No entanto, tínhamos que festejar a volta deste seu irmão e alegrar-nos, porque ele estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi achado.” (v. 7,10,32)
Sem sombra de dúvida, a questão do arrependimento é central nas três histórias. Nas duas primeiras, o resumo ou ensinamento fala diretamente disso. Na terceira, muito embora a palavra arrependimento não seja mencionada, este é explícito nos versículos 17 a 20:
“Caindo em si, disse: ‘Quantos empregados do meu pai têm comida com fartura, e eu aqui morrendo de fome! Vou me levantar, voltar para o meu pai e dizer a ele: “Pai, pequei contra o céu e contra ti. Já não sou digno de ser chamado teu filho; trata-me como um dos teus empregados”’. A seguir, levantou-se e foi para o seu pai.”
Apesar disso, a ênfase é na alegria do arrependimento, e não apenas no arrependimento. Nos versículos 7 e 10, Jesus resume as parábolas com uma declaração profunda e de grande significado teológico: há alegria diante de Deus devido ao arrependimento. Perceba que isso não diminui a importância da alegria. Pelo contrário, sem arrependimento não há alegria. No entanto, o arrependimento não encerra a história, a festa encerra a história.
Sem arrependimento não há alegria. No entanto, o arrependimento não encerra a história, a festa encerra a história.
A parábola dos dois filhos destaca ainda mais esse ponto central – por um lado, com a festa pelo retorno (arrependimento) do filho mais novo, por outro, com o ressentimento do filho mais velho. Há uma equação de profundo significado espiritual: aquele que se arrepende participa da festa, aquele que não se arrepende, mas se ressente da festa diante do arrependimento, perde a festa.
Em um próximo artigo vamos refletir sobre o filho mais velho e seu ressentimento, que na verdade não é quanto à festa, mas contra o próprio pai. Para este artigo, quero resumir observando como Jesus encerra a primeira parábola: há mais alegria por um arrependido do que por muitos que “não precisam” se arrepender. Essa é uma observação importante, pois aponta para o fato de que fariseus e mestres da Lei julgavam que não precisavam se arrepender, revelando sua arrogância e cegueira espiritual.
O apóstolo João aponta essa arrogância três vezes no capítulo 1 de sua primeira carta:
“Se afirmarmos que temos comunhão com ele, mas andarmos nas trevas, mentimos e não praticamos a verdade. Se afirmarmos que não temos pecado, enganamos a nós mesmos, e a verdade não está em nós. Se afirmarmos que não temos cometido pecado, fazemos de Deus um mentiroso, e a sua palavra não está em nós.” (1João 1.6,8,10)
Minha oração por mim e por você é que nosso coração esteja maleável diante do Espírito de Deus para lermos essas passagens com o seu propósito em mente. Creio que temos muito a aprender desse texto.
Autor
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Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por cinco anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem quatro filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 26º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.