Ao vermos a maldade ao nosso redor, podemos nos perguntar: por que Deus não castiga os maus? Por que os injustos ficam impunes?
Há alguns dias, na graciosa cidade de Gramado, no Rio Grande do Sul, um motorista em um carro de alto valor resolveu que, em vez de esperar sua vez em uma rotatória, era mais fácil contorná-la no sentido horário, dirigindo na contramão e ganhando talvez uns dois minutos em seu trajeto. Na mesma semana eu parei em uma sinaleira vermelha em um horário tranquilo (cerca de 20 horas). Não só fui ultrapassado por outros carros que aceleraram ao cruzar o sinal vermelho, como pelo menos um fez gestos obscenos para mim. Hoje cedo, por volta das sete horas da manhã, mais um carro na minha frente fez um retorno em local proibido e, para facilitar, o fez desrespeitando um sinal vermelho.
Coisas assim têm se tornado mais e mais comuns em nossas cidades. Não tenho uma base precisa, mas tenho a forte impressão de que mais e mais pessoas estão desconsiderando regras de trânsito. Não me julgo um legalista, mas entendo que regras existem para regular a convivência em sociedade. Um grupo de pessoas sem quaisquer regras se torna uma barbárie. Entendo também que há circunstâncias que justificam que quebremos regras. Por exemplo, ao transportar um acidentado, várias regras podem ser quebradas ou temporariamente suspensas. No entanto, creio que estamos vivendo uma crise de anarquia motivada especialmente pela sensação de impunidade.
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Temos vivido impunidade em vários níveis em nossa sociedade. Regras parecem se aplicar a uns e não a outros. Críticas de um candidato político contra seu adversário deixando de valer uma vez que este assume o poder. Réus confessos e condenados têm suas prisões suspensas e andam com toda liberdade, até mesmo assumindo cargos públicos. Minha esposa, que trabalhou por anos como professora na rede pública de Caxias do Sul, ouviu com frequência uma frase que parece ter se tornado um mantra nacional: “Não dá nada mesmo…”.
Temos vivido impunidade em vários níveis em nossa sociedade. Regras parecem se aplicar a uns e não a outros.
No livro de Jó, no capítulo 24, lemos a queixa de Jó contra Deus com respeito a não fazer valer a justiça. No entanto, ao final do capítulo, o próprio Jó reconhece que não há injustiça que fique sem retribuição. O apóstolo Paulo corrobora esta visão em pelo menos duas passagens: “Quem cometer injustiça receberá de volta injustiça, e nisso não há favoritismo” (Colossenses 3.25); e: “Portanto, a ira de Deus é revelada dos céus contra toda impiedade e injustiça dos homens que suprimem a verdade pela injustiça” (Romanos 1.18).
É provável, no entanto, que seja no livro de Habacuque onde encontramos tanto a indignação de um justo com respeito à impunidade, como a resposta de Deus para a injustiça. No capítulo 1, o profeta apresenta a Deus sua queixa contra a injustiça e impunidade que percebe em seu país. Ele chega a perguntar no versículo 13 do primeiro capítulo:
“Os teus olhos são tão puros que não suportam ver o mal; não podes tolerar a maldade. Então, por que toleras os traidores? Por que te calas enquanto os ímpios devoram os que são mais justos que eles?”
A resposta de Deus é tanto graciosa para com Habacuque como firme para com Judá. No capítulo 2, Deus lança uma sequência de advertências contra o roubo, contra lucros injustos, contra a violência, contra o engano e, por fim, contra a idolatria. Fica claro que, para Deus, não há impunidade.
“Portanto, a ira de Deus é revelada dos céus contra toda impiedade e injustiça dos homens que suprimem a verdade pela injustiça.” (Romanos 1.18)
Aprendemos ainda mais com a reação de Habacuque. Diante da declaração da justiça de Deus e do fato de que haverá consequências, o profeta começa o capítulo 3 exaltando e louvando a Deus, reconhecendo seu poder e sua justiça. Por fim, a partir do versículo 16, ele conclui que ainda que toda a estrutura econômica de seu país venha a ruir, ele vai se alegrar no Senhor. Repare os versículos 18 e 19 do capítulo 3 e contraste com a passagem acima:
“Ainda assim eu exultarei no Senhor e me alegrarei no Deus da minha salvação. O Senhor, o Soberano, é a minha força; ele faz os meus pés como os do cervo e faz-me andar nos meus lugares altos.”
Oro por minha vida e pela sua enquanto vivemos em um mundo de injustiça e impunidade. Que a minha e a sua reação sejam como a do profeta, nos alegrando no Senhor e buscando a sua presença mesmo em meio à injustiça.
Autor
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Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por cinco anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem quatro filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 26º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.
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