Até que ponto devemos nos preocupar em sermos agradáveis às pessoas ao pregarmos a Palavra?
Líderes cristãos, especialmente pastores, têm de andar em uma “corda bamba”. Por amor ao povo que serve, o pastor quer agradar e ser bem recebido por estes. Como exercer o seu ministério se for visto como alguém rígido, bravo e acusador? Ao mesmo tempo, todo pastor quer ver o rebanho sob seu cuidado crescer. Alguns acabam sacrificando a qualidade pela quantidade, mas mesmo um líder piedoso gostaria de ser usado por Deus para trazer mais e mais pessoas para a igreja.
No entanto, com frequência pessoas resistem à Palavra. Em Hebreus 4.12-13, lemos uma descrição precisa do efeito da Palavra em seus ouvintes:
“Pois a palavra de Deus é viva, eficaz e mais afiada que qualquer espada de dois gumes. Ela penetra a ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é apta para julgar os pensamentos e as intenções do coração. Nada, em toda a criação, está oculto aos olhos de Deus. Tudo, porém, está descoberto e exposto diante dos olhos daquele a quem havemos de prestar contas.”
Leia novamente o texto acima. Essa não é uma declaração de conforto ou que tranquiliza o leitor. Sim, Deus é amor e se preocupa conosco. Por isso, ele precisa tratar de nossos corações com profundidade e frequentemente com confrontação. O texto acima declara que nossos corações serão expostos, que nada ficará oculto. Isso não é popular ou traz tranquilidade. Um líder fiel vai apresentar ao povo a que serve a totalidade da Palavra de Deus (Atos 20.27). Com isso, haverá verdades e conceitos que vão deixar pessoas ofendidas ou desconfortáveis, mesmo quando apresentados com habilidade e cuidado.
Sim, Deus é amor e se preocupa conosco. Por isso, ele precisa tratar de nossos corações com profundidade e frequentemente com confrontação.
Diante dessa realidade, tenho visto pastores e líderes sofrerem quando percebem que precisam ensinar uma verdade confrontadora. Sabem que vão incomodar pessoas e nenhum líder amoroso quer incomodar o povo que serve. A sensação é semelhante a um pai ou mãe que precisam frustrar seu filho pequeno que insiste em um comportamento destrutivo. No entanto, cabe ao pai, por amor, restringir os comportamentos destrutivos dos filhos (por exemplo, só comer chocolate, ou sair em um dia frio sem agasalho, ou evitar certas companhias). Igualmente, ao líder espiritual cabe o papel de alertar aqueles a quem serve dos perigos ou erros que a própria Palavra denuncia.
Diante disso, me preocupo e me entristeço com pastores e líderes que decidem adaptar a Palavra aos gostos do mundo. Vários têm feito o apelo para atualizar ou aculturar a Bíblia. Creio que alguns podem até ter boas intenções, no sentido de não afastar não cristãos com uma “cultura” evangélica. Por exemplo, nossos cultos formais são apenas tradições e não parte inerente do evangelho. O princípio da reverência para com Deus não deveria tornar nossos eventos algo incompreensível para aqueles que não conhecem a cultura evangélica.
Tenho visto com frequência a diluição da integridade do evangelho para ganhar popularidade. O principal esforço é para reduzir qualquer menção a pecado ou arrependimento. Eu entendo que a palavra pecado tem uma conotação tão corrompida que talvez seja necessário explicar o conceito de outra forma. Minha frustração não é com novas palavras, mas com o abandono do conceito. Nosso pecado, entendido como rebeldia contra Deus, é parte fundamental do evangelho. Se não somos “pecadores” (rebeldes contra Deus), não precisamos de um Salvador.
Um compromisso de ter paz com Deus não vai tornar alguém popular ou amado pelo público em geral. Na verdade, é praticamente o oposto: uma vida piedosa incomoda!
Deixe-me me apressar em afirmar que não estou propondo um retorno a um tradicionalismo rígido, baseado em costumes anacrônicos, ou práticas ultrapassadas. Estou sim alertando à prática de selecionar o que a Palavra afirma para não ofender sensibilidades. Nesse sentido, igrejas têm optado por não mencionar o conceito de pecado ou por declarar aceitáveis comportamentos que são claramente apontados pela Bíblia como evidência de uma vida desalinhada com Deus.
Jesus faz, em Lucas 12.51, uma afirmativa que parece ir contra muito do que temos ouvido de pastores e líderes que buscam popularidade: “Vocês pensam que vim trazer paz à terra? Não, digo a vocês. Ao contrário, vim trazer divisão!”. O conceito de paz, conforme defendido em tantos círculos hoje, traz em si muita verdade e legitimidade. No entanto, parece ignorar uma verdade fundamental. Nossa maior necessidade de paz é com Deus (Romanos 5.1). Todas as guerras, conflitos e explorações humanas vêm de nossa falta de alinhamento com Deus (Tiago 4.1-10).
Dessa forma, um compromisso de ter paz com Deus não vai tornar alguém popular ou amado pelo público em geral. Na verdade, é praticamente o oposto: uma vida piedosa incomoda! Paulo adverte a Timóteo em 2Timóteo 3.12: “De fato, todos os que desejam viver piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos”.
Eu gostaria, assim como tantos líderes, de ser aceitável e agradável diante de todos. No entanto, meu compromisso maior é ser encontrado fiel para com aquele que me salvou e me chamou para proclamar seu evangelho. Oro para que você tenha o mesmo desejo e compromisso.
Autor
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Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por cinco anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem quatro filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 26º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.