É muito comum conversarmos com pessoas que já possuem uma opinião definida sobre certo assunto e, assim, qualquer diálogo se torna inútil. O mesmo aconteceu no julgamento de Jesus diante do Sinédrio, mas como Jesus reagiu? E quais lições podemos extrair das respostas do Senhor?
Talvez você já tenha enfrentado ou pelo menos ouvido falar da expressão “julgamento de cartas marcadas”. De forma geral, refere-se a um julgamento no qual a decisão do juiz já foi tomada mesmo antes de considerar as provas. Isso acontece frequentemente em sistemas autoritários em que se pretende manter uma aparência de legalidade. Há inúmeros exemplos em que julgamentos desse tipo ocorreram em ditaduras, alguns muito recentes, e vários juristas afirmam que é o que ocorre atualmente em nossa mais alta corte.
É muito provável que a grande maioria de nós não enfrentará uma situação dessas pessoalmente. No entanto, algo mais comum é sermos acusados por pessoas que não querem nem sequer ouvir o nosso lado da história. São pessoas que, antes mesmo da conversa, já chegaram às suas conclusões, agindo de forma amarga, irada ou dissimulada durante o diálogo.
Como reagir nesses momentos? Como se defender quando tudo coopera contra você? Tendo passado por situações assim, de modo geral minha reação era argumentar, tentar mostrar minhas “provas”, discutir se isso ou aquilo foi dito ou feito com esta ou aquela intenção… O resultado invariavelmente era apenas mais atrito; toda argumentação era distorcida para comprovar a condenação, e o resultado “planejado” era o mesmo. Em resumo, uma vez que uma pessoa tem uma posição fechada sobre você, qualquer conversa se torna uma paródia da justiça.

Assim, temos muito a aprender com o julgamento de Jesus diante do Sinédrio. Já li avaliações detalhadas do processo a partir do ponto de vista jurídico. Neste texto, quero apenas me deter nas três frases de Jesus na passagem de Lucas 22.66-71:
“Ao amanhecer, reuniu-se o Sinédrio, tanto os chefes dos sacerdotes quanto os mestres da lei, e Jesus foi levado perante eles. ‘Se você é o Cristo, diga-nos’, disseram eles. Jesus respondeu: ‘Se eu vos disser, não crereis em mim e, se eu vos perguntar, não me respondereis. Mas de agora em diante o Filho do homem estará assentado à direita do Deus todo-poderoso’. Perguntaram-lhe todos: ‘Então, você é o Filho de Deus?’ ‘Vós estais dizendo que eu sou’, respondeu ele.”
Repare que Jesus já havia sido preso e torturado. No versículo 2 deste mesmo capítulo, Lucas registra: “Os chefes dos sacerdotes e os mestres da Lei estavam procurando um meio de matar Jesus”. Ou seja, temos aqui um julgamento com “cartas marcadas”. Quando os líderes judeus, tendo desistido de falsas testemunhas, buscam com que Jesus se incrimine, ele diz três frases: (1) “se eu disser, vocês não crerão”, (2) “se eu perguntar, vocês não responderão” e (3) “vocês dizem que eu sou (o Filho de Deus)”. Vamos aprender com essas frases quando e como reagir diante de acusações injustas:
- Se eu falar, vocês não crerão. Diante de alguém com uma opinião fechada, não são nossas palavras que vão mudar algo. A pessoa já tem uma posição definida e não quer ouvir ou aprender, apenas concluir sua “condenação”. Jesus apenas declara que não adianta falar nada.
- Se eu perguntar, vocês não responderão. Em momentos assim, especialmente diante de pessoas que já tiraram suas conclusões contra você, não adianta fazer perguntas para levá-las a raciocinar. Elas não querem uma conversa, pois já têm certeza antes de engajar na discussão. Jesus não tenta prolongar a conversa.
- Vocês dizem que eu sou o Filho de Deus. Essa é talvez a frase mais curiosa do texto. Estudiosos afirmam que é como se Jesus dissesse: “Eu não colocaria assim, mas você tem razão…”. Era óbvio que afirmar ser o Filho de Deus traria condenação entre os judeus, ao mesmo tempo Jesus não podia negar a verdade.
Como, então, reagir quando somos acusados injustamente por alguém que já tem sua conclusão antes mesmo de nos ouvir? Seguindo o exemplo de Jesus, eu resumiria em duas palavras: mansidão e rendição. Mansidão, pois o ataque ou a discussão não vai gerar justiça. Mansidão não por sermos derrotados, mas porque nos submetemos a uma justiça maior (Gálatas 1.10). E rendição, pois nossa esperança não jaz na justiça deste mundo, mas na justiça de Deus (Tiago 1.19-20).
Minha oração é que saibamos reagir com mansidão e rendição a Deus diante de julgamentos de “cartas marcadas” – tanto a nível pessoal como nacional. Injustiça é característica humana, mas esperamos no Senhor, o justo Juiz (Salmo 94).
Autor
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Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por cinco anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem quatro filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 26º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.
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