Essência do Evangelho

A salvação é pela fé, não por obras. Mas como deve ser a vida do cristão após ser salvo? Qual o elemento principal de sua nova vida?

Recentemente recebi um breve vídeo do pastor Ed Rene em que o entrevistador lhe pergunta se homossexuais vão para o céu. A resposta dele, curiosamente mencionando o “melhor entendimento da teologia cristã”, foi de que ninguém vai ou deixa de ir para o céu baseado no que fez ou deixou de fazer, ou seja, em obras. No decorrer de sua resposta, ele mais uma vez tentou se defender de sua afirmativa sobre atualizar a Bíblia. Inclusive se referiu à Bíblia com expressões como “Palavra de Deus” e “inspirada”. Na verdade, as definições dele para essas expressões são muito distantes da ortodoxia bíblica. Para ele, seguindo a posição da teologia liberal do início do século passado, a Bíblia é apenas registro de experiências que homens tiveram com Deus e não uma palavra revelada.

No entanto, sua resposta quanto à salvação está completamente certa. Ninguém é salvo por obras ou por obediência. Paulo deixa isso muito claro, por exemplo, na passagem de Efésios 2.8-10:

“Pois pela graça vocês são salvos, por meio da fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus; não por obras, para que ninguém se glorie. Porque somos feitos por Deus, criados em Cristo Jesus, para boas obras, as quais Deus preparou previamente para que andássemos nelas.”

Por um lado, a salvação é inteiramente pela fé, dom de Deus. Não há nada que possamos fazer que nos torne aceitáveis diante de Deus. No entanto, mesmo uma leitura superficial não para aí. Repare como, após deixar claro a salvação pela fé, no versículo 10 Paulo destaca que Deus tem sim “boas obras” preparadas de antemão para que nós andemos nelas. Em outras palavras, somos salvos exclusivamente pela fé, mas nossa relação com Deus não termina aí. Ela nos conduz a andarmos em santidade.

Esses dias estive lendo e meditando sobre Lucas 18.9-14, a parábola onde o fariseu e o publicano sobem ao templo para adorar. Na conclusão da parábola, Jesus afirma: “Eu digo que este homem, não o outro, foi para casa justificado diante de Deus. Pois todo aquele que se exalta será humilhado, e todo aquele que se humilha será exaltado”. Mais uma vez a essência do evangelho é destacada. Aquele que se humilhou e pediu misericórdia foi justificado, quem confiou em seu próprio procedimento e justiça não foi justificado diante de Deus.

Somos salvos exclusivamente pela fé, mas nossa relação com Deus não termina aí. Ela nos conduz a andarmos em santidade.

Para mim é importante, mais uma vez, perceber como a centralidade, a essência do evangelho é o arrependimento. Importante também destacar que o arrependimento não termina apenas em reconhecer seu erro, mas em colocar seu coração em morrer para o pecado (Lucas 9.23). No entanto, foi uma outra expressão usada por Jesus que chamou minha atenção. No início do versículo 11 lemos: “O fariseu, em pé, orava no íntimo…”. A expressão “no íntimo” pode ser traduzida por “orava consigo mesmo”. É uma construção curiosa no grego e, caso não tivéssemos o restante da história, poderíamos deixar apenas como isso, uma expressão curiosa. No entanto, tendo em vista o conteúdo de sua oração, onde apenas lista suas virtudes, creio que o significado é mais profundo. Creio que esse fariseu não orava a Deus, apesar de cumprir os rituais religiosos. Acredito que ele estava apenas refletindo sobre sua virtude diante de Deus. Nesse sentido, ele realmente falava consigo mesmo.

Antes de sermos excessivamente rápidos em condená-lo, deixe-me perguntar a você, meu leitor: alguma vez em sua oração você passou de uma comunicação com Deus para reflexões pessoais que, se for sincero, nem sequer incluíam a Deus? Eu devo confessar com certa vergonha que com alguma frequência me peguei nessa prática. Começo a orar com devoção, buscando a Deus e derramando meu coração diante dele. No entanto, de repente me percebo apenas refletindo sobre minha vida, sobre o que preciso fazer, sobre meus desafios e frustrações. Eu acredito que, se formos sinceros, a maioria de nós já passou por isso.

A centralidade, a essência do evangelho é o arrependimento.

O problema não está em nos distrairmos enquanto oramos, mas em permitir que esse seja o padrão de nossas orações. Ao invés de ouvirmos a Deus e falarmos com ele, ouvimos nossos próprios pensamentos e conversamos com nós mesmos. Quero desafiar você a examinar suas orações. Caso você perceba que, em alguns momentos, suas orações são apenas conversas consigo mesmo, pare, arrependa-se e volte a buscar ao Senhor. Afinal, essa é a essência do evangelho, arrepender-se, parar e voltar a alinhar sua vida com o Senhor (Apocalipse 2.5).

Autor

  • Daniel Lima

    Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por cinco anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem quatro filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 26º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.

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