Inerrância e Exposição Bíblica: Uma conversa com John MacArthur

Entrevista realizada com John MacArthur sobre a inerrância e a exposição bíblica de todas as Escrituras e sobre a atual situação no mundo e as dificuldades que pregadores têm em manejar bem a Palavra de Deus.

Ao longo da história da igreja, a Palavra de Deus tem sofrido ataques com o objetivo de minar sua autoridade. Contradizer ou interpretar erroneamente a Palavra de Deus é uma abordagem que os inimigos de Deus usaram em toda a história humana, começando com a Serpente no jardim do Éden. Enquanto Deus afirmou a Adão que, se ele desobedecesse, “certamente morrer[ia]” (Gênesis 2.17), a Serpente declarou a Eva: “É certo que vocês não morrerão” (3.4). Mais tarde, o apóstolo Pedro explicou que os ímpios deturpam todas as Escrituras (2Pedro 3.16).

Em resposta a esses ataques, homens de Deus têm se levantado ao longo da história da igreja para afirmar seu compromisso com a Palavra de Deus. A primeira e mais importante resposta foi o Concílio de Jerusalém, que abordou a questão “o que é preciso fazer para ser salvo?” (veja Atos 15). Mais tarde na história, e fora da Bíblia, os Concílios de Niceia (325 d.C.) e Calcedônia (451 d.C.) desempenharam papéis importantes na confirmação do compromisso da igreja com a Palavra de Deus.

Na história recente, a inerrância das Escrituras, no que se refere à hermenêutica e à exposição bíblica, tem sofrido ataques constantes. Para oferecer uma resposta bíblica, líderes evangélicos se reuniram em 1978 e novamente em 1982 no International Council on Biblical Inerrancy [Conselho Internacional de Inerrância Bíblica] e declararam que a Escritura, em sua forma original, é inerrante e que a hermenêutica adequada deve ser aplicada para explicar o significado da Palavra de Deus. O objetivo dessas duas declarações era articular princípios que ajudassem o pregador a ser aprovado por Deus “como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade” (2Timóteo 2.15).

A entrevista abaixo foi realizada com John MacArthur (1939-2025), que integrou o grupo de líderes evangélicos participantes da reunião de 1982.

Austin T. Duncan (a partir de agora ATD): ao considerar a exposição bíblica e o evangelicalismo atual, você se preocupa com o fato de que haverá um afastamento da pregação expositiva com foco exegético? Quais perigos você vê nos dias de hoje e no futuro?

John MacArthur (a partir de agora JM): o perigo para qualquer pregador é deixar de estudar a Palavra a fim de ser aprovado por Deus. O perigo é deixar de ser um obreiro que não se envergonha e que maneja bem a Palavra da verdade. O perigo é depender de sua personalidade ou de suas percepções em vez de trazer à tona a vida dentro do texto. Esse é o principal perigo em todas as gerações.

No futuro, acho que haverá a tentação de usar a Bíblia, mas evitar ofender as pessoas porque a ofensa é muito perigosa. Há pessoas que tentam pregar expositivamente, mas não querem apresentar certas conclusões doutrinárias porque elas ofendem as pessoas. Mas usar a Bíblia como uma espécie de buffet, onde você pode escolher o que quiser, mas fica longe das verdades difíceis – isso não é exposição.

Se você já cedeu a esse ponto e se recusa a pregar a verdade hoje, será mais difícil tomar uma posição à medida que as coisas ficarem mais difíceis.

E isso já está acontecendo em muitos casos com os caras das megaigrejas que não querem ofender ninguém. Você vê isso no tipo de pregação popular em que uma das maiores igrejas dos Estados Unidos diz às pessoas para abandonar o Antigo Testamento. Se você é um pregador e diz: “Esqueça o Antigo Testamento”, como um pregador popular disse recentemente, ou se você diz: “Nossa fé não depende de um livro antigo”, o que você está dizendo sobre a Palavra de Deus? É um nível de arrogância incrível! É o mesmo que dizer: “Eu sou Deus! Eu sou a fonte da verdade”. Alguns até pensam que o evangelismo é mais eficaz se você nunca disser nada que ofenda alguém, o que é absolutamente o oposto da verdade. Se você já cedeu a esse ponto e se recusa a pregar a verdade hoje, será mais difícil tomar uma posição à medida que as coisas ficarem mais difíceis. Provavelmente haverá cada vez menos pessoas dispostas a pregar todas as Escrituras como a Palavra de Deus.

ATD: a admoestação é sempre a mesma: pregue a vitalidade da Palavra de Deus – sem filtros. Estude-a cuidadosamente! Não pule nada! Não se adapte à cultura! Não escondam nada por medo de perseguição!

JM: exatamente! O ataque continua vindo, mas pode ter um rosto diferente. Estamos vivendo em uma época em que você pode ser criticado por dizer certas coisas. Mas daqui a dez anos, talvez você seja mais do que criticado. A tendência nos diz que a hostilidade contra a Palavra de Deus vai aumentar. Estamos vendo a homossexualidade, a justiça social, a guerra contra nossas crianças e todas as formas de maldade tomando conta de nossa cultura. As pessoas descrentes que estão promovendo tudo isso não vão tolerar uma força forte que resista à pauta delas. E a força mais resistente será a dos cristãos com convicções baseadas na Palavra de Deus. Então eles virão atrás dos cristãos. Isso é exatamente o que vimos durante a pandemia. Eles jogaram nossos irmãos no Canadá na cadeia. Acho que a firmeza cristã, a convicção bíblica e o amor pelo Senhor e por sua Palavra a qualquer custo é que marcarão os verdadeiros expositores. Futuramente será necessária força espiritual para que os homens subam em um púlpito e digam a verdade. Se você não estiver disposto a falar a verdade agora, é muito provável que não estará disposto a falar a verdade no futuro.

ATD: estamos nos aproximando da quadrigésima turma de graduandos do The Master’s Seminary. O que você diria à atual geração de expositores? Que conselho você dá a eles à luz dessas tendências?

O poder da obra de Deus não está no pregador, mas na Palavra de Deus.

JM: eu digo a eles a mesma coisa que digo a todas as turmas há quarenta anos. Façam o que Deus os chamou para fazer. Sejam fiéis na pregação da Palavra, seja em época ou fora de época. Houve épocas em que a época era a certa; agora está fora de época. Mas isso não muda o encargo. Reprovar, repreender, exortar – com grande paciência e ensino. Seu chamado é claro.

ATD: enquanto os homens combatem esse bom combate, como eles permanecem fiéis em seu ministério da Palavra?

JM: as pessoas falam sobre coragem no ministério, mas acho que não é tanto a coragem que o leva a cumprir esse mandato, mas sim a confiança no Senhor e no poder da sua Palavra. Quando alguém deixa de liberar a Palavra de Deus, é porque não acredita que ela seja realmente o poder. Zacarias disse que não foi por força nem por poder, mas pelo Espírito de Deus (Zacarias 4.6). Isaías disse que a Palavra de Deus não voltará vazia (Isaías 55.11). Isso também é o que o apóstolo Paulo pregou: “Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação…” (Romanos 1.16). O poder da obra de Deus não está no pregador, mas na Palavra de Deus. É aqui que tudo se encaixa. A compreensão de que a Palavra de Deus é inerrante e poderosa o obrigará a pregar a Palavra de Deus de forma expositiva. O pastor que realiza essa tarefa fielmente é aquele que não precisa se envergonhar.

Este artigo foi adaptado e extraído de John F. MacArthur e Austin T. Duncan, “Inerrancy and exposition: a conversation with John MacArthur”, The Master’s Seminary Journal 34/2 (primavera 2023). Disponível em: https://tms.edu/wp-content/uploads/2024/11/TMSJ-34.2-rev.-11.24.pdf. Acesso em: 16 jul. 2025. Publicado com generosa permissão.

Autor

  • Austin T. Duncan (D.Min., The Master's Seminary) é o diretor do The MacArthur Center for Expository Preaching e diretor do departamento de ministérios pastorais do seminário. Austin é especializado em homilética e também serve como pastor. Casado com Merrily, tem três filhas e um filho.

    Ver todos os posts

Artigos relacionados

Um grande desafio que atualmente contribui para a confusão religiosa no cristianismo ocidental é o humanismo secular. O que significa...